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Prefácio de “A mão e a Luva”

Prefácio de “A mão e a Luva”

Por Diogo Cruxen

O segundo romance escrito por Machado de Assis, “A mão e a luva” (1874), indica já um escritor com potencial altíssimo. Na preocupação horaciana de condensar para não trazer prejuízo à forma, a estória passa rapidamente pelos nossos olhos, de maneira econômica, reta e espontânea. Um estratagema de quem, ainda que não fosse o gênio da literatura, talvez tivesse plena convicção disso e, por esse mesmo motivo, escreveu com prudência.

A descrição das personalidades é cirúrgica, preocupando-se em fazer-nos notar o que há de essencial em suas personagens a fim de que nós, leitores, julgássemo-las em companhia do autor. Segundo ele mesmo, seu único real desejo era “mais se [ocupar] de desenhar um ou dois caracteres, e de expor alguns sentimentos humanos”.

Neste romance, Machado ainda não é aquele narrador de “Dom Casmurro” que nos entrega uma estória com vocabulário “obtuso e dissimulado” – como muito bem observou o professor Rodrigo Gurgel.

Não existem vilões em “A mão e a luva” e isso é curiosíssimo pois essa fórmula Machado repete em “Dom Casmurro”. Ao contrário de “Brás Cubas”, sabemos que o personagem é corruptível. Entretanto, este escritor teve o talento ímpar de fazermos encontrar nas suas personagens traços em comum, seja nos vícios ou nas virtudes.

Se vale a pena ler esse romance quase inaugural de Machado? Sem dúvida alguma.

A mão e a luva” é uma oportunidade de conhecer o Machado sincero, amigo do leitor, sem sua ironia nietzschiana tão presente em “O alienista”. Chance única de toparmos com “o fazer” do artista em seu ateliê, conhecendo através dos bastidores o seu processo criativo.

Trata-se de um verdadeiro manual da alma que relata com profundidade – ao mesmo tempo de forma sintética – três tipos de caráteres (os pretendentes de Guiomar) que simulam perfeitamente as três fases da vida do homem: a juventude em Estevão, sendo ele irreflexivo, impulsivo e iluso; a fase inicial adulta em Luís Alves pois encarna o indivíduo já seguro de si, ansioso por aplicar a experiência que colhera até o despertar da maturidade; e a idade adulta avançada em Jorge, quando as ambições correm o risco de se tornarem apagadas quando coloca-se “a vida no automático”.

Como disse, não há vilões, há apenas faces de uma mesma vida. Comportamentos nossos em diferentes períodos de nossa história.

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